Faz sentido servir almoços e jantares todos os dias? À conversa com Tomás Akslen

Faz sentido servir almoços e jantares todos os dias? À conversa com Tomás Akslen
Tomás Akslen, proprietário do Varanda do Casal, partilha a sua visão sobre a restauração em Portugal durante uma entrevista, em frente ao restaurante situado na pitoresca Aldeia do Xisto de Casal de São Simão.

A restauração é um setor vibrante, onde desafios e oportunidades coexistem em permanente equilíbrio. Gerir um restaurante de sucesso exige paixão, dedicação e uma visão estratégica bem definida. Para explorar a realidade deste mundo, conversámos com Tomás Akslen, proprietário do Varanda do Casal, um restaurante encantador localizado na pitoresca Aldeia do Xisto de Casal de São Simão. Reconhecido por combinar a gastronomia tradicional portuguesa com um ambiente contemporâneo, este espaço é um exemplo de como autenticidade e inovação podem andar de mãos dadas.

Nesta entrevista, Tomás partilha a história do Varanda do Casal, reflete sobre os desafios da restauração em Portugal, aponta tendências emergentes e oferece conselhos valiosos para quem ambiciona entrar neste mercado. Seja você um empreendedor no setor ou apenas um curioso apaixonado por gastronomia, esta conversa é uma fonte de inspiração e conhecimento.


Sobre o restaurante e a sua história

Qual é a história do Varanda do Casal? Como surgiu este projeto?

O restaurante Varanda do Casal nasce de um projeto para dinamizar o interior e as aldeias de xisto. A minha participação começa num dia em que fui almoçar ao restaurante e o dono da altura partilhou comigo que queria vender o negócio. Eu então que já tinha outros investimentos na aldeia decidi juntamente com um sócio adquirir e explorar o estabelecimento.

O que te levou a abraçar esta iniciativa?

Eu gosto de desafios e este era algo que me diz um pouco mais pois senti que podia acrescentar valor de uma forma mais significativa do que em Lisboa. A ideia de viver entre Lisboa e o campo também me atraiu.

Como descreves a filosofia do restaurante, tanto na gastronomia como na experiência proporcionada aos clientes?

Nós somos um espaço de cozinha portuguesa. A nossa carta tenta retratar a região em que se situa, trazendo ingredientes como javali e veado. Temos uma gastronomia de “conforto” de serra, com alguma sofisticação de forma a poder trazer elementos de surpresa à experiência do nosso cliente.

A experiência tem que começar ainda antes do cliente ter entrado. Daí estarmos a renovar o espaço e a fazer uma aposta forte em iluminação para acrescentar mais valor ao horário de jantar.

Quais são os pratos emblemáticos do Varanda do Casal?

Neste momento são:

  • Empadão de Rabo de Boi com Ameixa e Castanhas
  • Bode Assado (5h) com Arroz de Forno de Feijão Fresco
  • Lombo de Bacalhau Lascado com Migas de Grão e Tomate Seco

A Aldeia do Xisto de Casal de São Simão tem um forte apelo turístico. De que forma isso influencia o funcionamento do restaurante?

Esta e acredito que as outras aldeias de xisto também, sofrem de uma sazonalidade bastante acentuada. Ou seja, existe a realidade de inverno e a realidade verão. Isto obriga, que no verão tenhamos que ter às vezes pessoas que não fazem parte dos quadros da equipa o que traz sempre muitos desafios (mesmo com a melhor formação). O objetivo agora é conseguir aumentar o nosso valor ao cliente de forma a que consigamos manter uma equipa mais estável o ano todo.

Sabemos que estão a realizar obras importantes. Há alguma mudança no conceito ou na estrutura do espaço que possas revelar?

Ahaha =), deixo uma imagem para os curiosos. O conceito e a estrutura do espaço vão manter-se mas vamos ter uma intervenção significativa de interiores e algumas mudanças exteriores mais relacionadas com a proteção solar.

Pré-visualização do novo design do Varanda do Casal, com um espaço renovado e melhorias na iluminação e proteção solar para uma experiência ainda mais acolhedora.

O Desafio de Gerir um Restaurante em Portugal

Quais são os principais obstáculos que um empresário da restauração enfrenta atualmente em Portugal?

Bem, existem vários, mas, vou-me focar num que é pouco ou nada falado que são as plataforma online de reservas como o The Fork. Os restaurantes têm que ter cuidado pois muitos aderem sem fazerem contas. Olham para a lista de restaurantes conhecidos que existem lá mas esquecem-se que muitos têm condições de adesão/permanência que eles não vão ter e estão a servir como âncora para criar o sentimento de FOMO.

É preciso perceber que estamos a falar de uma empresa que o foco deles é o rigor analítico e a análise minuciosa de dados de comportamentos do consumidor. Isto faz com que para muitos restaurantes dependam  delas para um olhar mais analítico do consumidor e, não são poucos os casos, onde aquela é a única presença digital digna que têm. Um perigo…

O que vai acontecer se nada for feito, é que o The Fork  vai-se tornar para os restaurantes o que a Booking é para os hotéis/alojamentos. E quando isso acontecer, ou tu juntaste ou não existes…PS: Alguém se lembra da comissão com que a Booking começou? Uma coisa eu sei, não foi 15‰…

A escassez de mão de obra é um tema recorrente no setor. Como geres a tua equipa e asseguras um serviço de qualidade?

Outro tema que está a começar a ser falado mas ainda não o suficiente é a questão dos horários. A semana de 4 dias de trabalho vai acontecer e já está a acontecer. Muitos restaurantes precisam de se reorganizar e perceber se faz sentido estar a fazer almoços e jantares todos os dias. Repare no novo restaurante que abriu em Lisboa chamado BAZ só abre de quinta a domingo e só faz jantares com o horário das 18 às 02:00. Vamos ver cada vez mais restaurantes com horários de abertura alocados ao turno mais produtivo e o outro está fechado. Eu já faço isso ao meu, é preciso que cada empresário pense bem no seu negócio para encontrar o seu modelo de horário. Pois, aqui não há uma receita que dá para todos.

O que depois posso dizer é que se houver horários adequados para uma vida equilibrada, a mão-de-obra torna-se algo mais fácil de resolver. Pelo menos, essa tem sido a minha experiência.

Outro tema aqui, mas que será para uma próxima análise são as gorjetas que já aparecem na conta. Vieram para ficar.

Como vês a questão da rentabilidade na restauração? Quais são os maiores custos e como podem ser optimizados?

Eu diria que um tema muito relevante é a fatura de eletricidade. Muito facilmente chega-se a uma fatura de 1000€ mês. Isto leva a que depois muitos empresários tenham o sentimento que estão a ser comidos por todos os lados e leva a dois fechos - evasão fiscal ou o encerramento.

Os restaurantes fora dos centros urbanos devem ter uma estratégia (dentro do possível, pois, se é um r/c de um prédio não há muito mais a fazer do que ter equipamentos eficientes) de independência energética. Pois, nós não podemos estar sempre a reflectir ao cliente cada vez que os preços nos são aumentados, e o sítio que acho que dá para ter um grande impacto nas contas é aí.

Outro sítio de muito fácil impacto é perceber que o momento que acrescenta menos valor à experiência do cliente é o ato de pagar. Restaurantes que façam 300 refeições num dia, se automatizarem os seus pagamentos (com a De Grazie p.ex.) têm de pagar menos um ordenado…

Fidelizar clientes é um desafio constante. Que estratégias têm funcionado para atrair e reter clientes no Varanda do Casal?

Uma só palavra - consistência. Às vezes, menos é mais. A nossa estratégia passa muitas vezes por saber gerir as reservas e só deixar o cliente sentar-se quando nós estamos preparados.

O que achas que os clientes mais procuram nos restaurantes hoje em dia? Experiências únicas, produtos locais, sustentabilidade?

Eish… pergunta difícil. Mas se tivesse que dizer uma coisa seria a procura de um sítio que oferece uma boa relação de qualidade/preço. Não significa que o preço seja alto ou baixo, significa que tu sais da experiência com a sensação que pagaste o valor justo - até pode ser de 100€…

Como imaginas o futuro da restauração em Portugal? Que mudanças prevês para os próximos anos?

Imagino um bom futuro. Acho que há muito espaço de desenvolvimento para criar conceitos inovadores e dinheiro a ganhar. Surpreende-me só como é que private equity ainda não entrou a sério no setor.

Se pudesses dar um único conselho a quem quer abrir um restaurante hoje, qual seria?

Perceber de cozinha.

Há alguma tendência internacional que te inspire e que gostarias de ver mais implementada em Portugal?

Gostaria de ver o Shake Shack a vir para cá como também o grupo de comida italiana chamado Big Mamma. Ambos fariam uma pequena revolução no seu segmento de mercado.

A restauração é um setor exigente. O que te mantém motivado e te faz sentir que todo o esforço vale a pena?

Adoro criar e viver no futuro, e, não menos importante, comer. Diria que é essa adrenalina e fome (nos dois sentidos) que me motivam!


Sobre a deGrazie

O Varanda do Casal utiliza a tecnologia de pagamentos à mesa da deGrazie há três anos e, mais recentemente, adoptou também o nosso sistema POS.

Que impacto estas soluções tiveram na operação do restaurante ao longo destes últimos anos?

No seguimento do que já foi dito, a Degrazie deu-nos a possibilidade de retirar uma camada de complexidade à operação sem retirar uma camada de valor à experiência do cliente. Pelo contrário, até reforçou o valor da experiência pois o cliente não precisa de esperar pela sua conta…

Notas Finais

Esta entrevista com Tomás Akslen oferece uma perspectiva privilegiada sobre o que é gerir um restaurante em Portugal nos dias de hoje. Entre os desafios do setor e as oportunidades que surgem de uma abordagem criativa e dedicada, o Varanda do Casal destaca-se como um exemplo de resiliência e inovação. Fique atento ao blogue da deGrazie para mais histórias inspiradoras e reflexões sobre o mundo da hotelaria!

Hugo Hilário

Hugo Hilário

Lisboa